quinta-feira, 25 de agosto de 2011

A mulher que foi abduzida - Assombros urbanos (Dionísio Jacob)


    Reli ‘Assombros urbanos’. O que posso dizer? Ficava sozinha rindo feito uma boba! Tudo muito normal, pois o livro é engraçadíssimo!
    Separei trechos de uma entrevista de mais uma pessoa estranha ao programa Assombros na Madrugada. Como sempre, Lima, o apresentador limão, tira a maior onda. Vejam:

***


LIMA – Várias manchetes diziam, com sutis variações entre elas, que uma balconista do Mappin havia abordada por um alienígena. Bem, claro, nossa produção foi atrás e trouxe a senhorita Gorete Maria da Silva, a balconista em questão, até nossos estúdios. Entre, por favor, Gorete.
(...)
GORETE: O senhor é gozado. Bom, foi o maior corre-corre. Acharam que era um assaltante. Fui até a delegacia. Quando eu comecei a explicar, pronto... tinha jornalista lá perto e a coisa toda começou.
LIMA: E você não viu mais o ET?
GORETE: Na hora ele sumiu.
LIMA: Eu faria o mesmo.
GORETE: Depois de uma semana, ele apareceu. Me convidou para jantar. Fomos ao cinema e tudo.
LIMA: Escuta, Gorete. Como você pode ter certeza de que ele é um alienígena? Por acaso ele possui antenas, é verde, essas coisas?
GORETE: Não... não. De aparência normal, como qualquer ser humano. Quer dizer, essa é a forma que ele está usando.
(...)
LIMA: Às vezes a cabeça da gente engana, Gorete. Vai ver que a senhorita gostou do rapaz e sua cabeça provocou uma fantasia. Aí, depois que saiu aquilo tudo no jornal, o rapaz, que não é bobo nem nada, voltou para representar o papel que lhe foi imposto pela mídia. O que você acha dessa minha teoria?
 
GORETE TEM UM ATAQUE DE FÚRIA. LEVANTA-SE E APROXIMA DEDO DO ROSTO DE LIMA.

GORETE: Quer calar essa boca imunda?
LIMA: Como?
GORETE: Não foi nada disso! Ele é um ser de outro planeta. E ele é muito gentil, sabia? Nós nos apaixonamos. Ele... ele... ele me abduziu!
LIMA: E como isso aconteceu?
GORETE: Fomos até a nave dele.
LIMA: Você entrou na nave?
GORETE: Foi uma coisa muito espantosa. Nós fomos teletransportados para lá.
LIMA: Como assim?
GORETE: A gente estava na minha casa e começamos, o senhor sabe... bem...

GORETE FICA RUBORIZADA. OLHA PARA O CHÃO.

LIMA: Eu entendo, Gorete. Nosso público também. A senhorita não precisa entrar em detalhes. E aí?
GORETE: Então surgiram faíscas, luzes, e, quando eu vi, estava dentro da nave, atravessando o céu. Cada toque nosso produzia faíscas coloridas.
LIMA: Faíscas coloridas?
GORETE: Multicores. Parecia uma festa de São João.
Lima: Sei.
(...)

GORETE SE LEVANTA E VAI ATÉ A CÂMERA.

GORETE: Volte, Gípion, volte! Volte!
LIMA: Gorete... se acalme.
GORETE: eu sei que você me ama. Eu sei. Nossa experiência foi muito profunda. Volte, Gípion!
(...)
LIMA: Nosso programa já não tem público na Terra, que dirá em outra galáxia! Gorete, desculpe dizer, mas acho que você foi iludida. Vai ver, seu querido alienígena mora aí mesmo em diadema.
(...)
GORETE: Está vendo? Está vendo isto aqui?
LIMA: O que é isso?
GORETE: Uma pistola de raios paralisadores.

LIMA NÃO CONSEGUE EVITAR UMA GARGALHADA, QUE REPRIME COM MUITO CUSTO. APANHA O REVÓLVER E O ANALISA.

LIMA: Gorete, isto aqui é um revólver de plástico!
GORETE: Não é, não!
(...)

GORETE APONTA A PISTOLA PARA A PRÓPRIA CABEÇA E ACIONA O GATILHO, QUE ACIONA UMA LUZ E UM BARULHO. IMEDIAMENTE, ELA CAI NO SOFÁ, PARALISADA.

(...)
LIMA: Ela está enrijecida.

LIMA OLHA PARA A PISTOLA.

LIMA: Será que essa geringonça funciona mesmo?

LIMA OLHA PARA O FUNDO DO ESTÚDIO.

LIMA: Luísa, Luísa, a moça congelou; Precisamos tirar ela daqui. Se tivesse alguém assistindo, ia ser maravilhoso. A mulher simplesmente virou uma estátua.

 
JACOB, Dionísio. Assombros urbanos. São Paulo: Companhia das Letras, 2003. p.31-40


Um comentário: